A dignidade por trás do drama

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Uma exposição fotográfica apresentada pela primeira vez no Brasil trouxe um recorte de uma dramática realidade que se repete ao longo da história e que está sendo vivida por milhares de pessoas enquanto é lido este texto: a vida de refugiados.

Escola, campo de Kyangwali, Uganda, 1968. (©Jean Mohr)

Escola, campo de Kyangwali, Uganda, 1968.

(©Jean Mohr)

Dividida em duas partes, a mostra "Junto às vítimas" contava com imagens do acervo do Musée de l’Elysée, de Lausanne, assinadas pelo reconhecido fotógrafo suíço Jean Mohr, entre outros registros de ações humanitárias do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) ao longo de mais de 150 anos de atuação.

As fotos de Mohr flagram situações dessas pessoas em meio a conflitos armados no mundo, assim como o dia a dia delas encarando as dificuldades em sobreviver, se readaptar e refazer suas vidas. Embora não tenha sido idealizada por conta da atual crise de imigração na Europa, o evento contribui em trazer um olhar mais humanitário e uma reflexão sobre a situação, além de apresentar uma versão menos estereotipada da vida desse tipo de imigrante pelo mundo.

"A exposição mostrava a dignidade por trás do drama e como as pessoas buscam um caminho para refazerem suas vidas", conta Niculin Jäger, Ministro da Embaixada Suíça no Brasil, responsável pela realização do evento junto com o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV). Nas imagens, homens, mulheres e crianças provocam emoção sem sensacionalismos, levando o expectador a encarar as consequências de atitudes que, embora muitas vezes paradoxais, são chamadas de humanas.

População civil

Refugiada moçambicana na missa de domingo, área de instalação em Lundo, Tanzânia, 1968. (©Jean Mohr)

Refugiada moçambicana na missa de domingo, área de instalação em Lundo, Tanzânia, 1968.

(©Jean Mohr)

As 40 imagens de Mohr, que também é documentarista, são resultado de um trabalho que começa desde o final dos anos 1940 para o CICV. Nascido em Genebra, Mohr é filho de alemães oponentes do nazismo que imigraram para a Suíça. Tendo acompanhado conflitos e deslocamentos de refugiados, como em Uganda, em 1968; Chipre, em 1974; e Líbano, em 1983, ele deixa claro nas suas fotos que a sua lente está sempre direcionada para a população civil.

As fotografias podem ser vistas em estruturas montadas na área externa do Museu Nacional do Conjunto Cultural da República. Os painéis ao ar livre contam com tecnologia fotovoltaica, que permite a captação da luz solar durante o dia para serem iluminados com autonomia de energia à noite. Já na Galeria Térreo, o público também pode ver gratuitamente imagens que apresentam uma parte significativa do conceito e do trabalho do CICV, que atua em 190 países, inclusive no Brasil, onde está presente desde 1908 e que teve como primeiro presidente o sanitarista Oswaldo Cruz.

História da Cruz Vermelha

Refugiados curdos aguardando distribuição de comida, campo de Qatr, Mahabad, Irã, 1991. (©Jean Mohr)

Refugiados curdos aguardando distribuição de comida, campo de Qatr, Mahabad, Irã, 1991.

(©Jean Mohr)

Essa exposição registra ações do CICV desde o seu início, atuando em países como Rússia e Estados Unidos; durante as duas Guerras Mundiais; em conflitos armados em diversos países, como o Iêmen, Vietnã, Etiópia e Nigéria; além de regimes militares da América Latina; e as consequências humanitárias dos mais recentes conflitos que abalam o mundo, como o da Síria e o da República Centro-Africana. Um trabalho que tem por objetivo exclusivamente a assistência e proteção à vida, na tentativa de manter a dignidade das vítimas de conflitos armados e outras situações de violência, sem fazer distinção entre elas.

"Registros importantes de uma realidade que sempre se repete", diz o Ministro Jäger, lembrando haver 60 milhões de refugiados no mundo atualmente. Pessoas que o CICV tem ajudado desde a criação da entidade pelo suíço Henry Dunant há 152 anos. Para o Ministro, a Suíça tem uma obrigação dupla em olhar para essa questão. Isso porque, além de ser sede da Cruz Vermelha, a Suíça é o Estado depositário das Convenções de Genebra, que desde 1864 visa proteger e reduzir os efeitos das guerras sobre a população civil.

O Ministro também acredita que a mostra pode despertar o interesse de brasileiros para o trabalho no CICV, antes permitido apenas aos suíços, e agora aberto a todas as nacionalidades. Para ele, fomentar esse conhecimento é uma contribuição importante para gerar consciência de que realmente é preciso fazer algo pela dignidade humana.

CICV e as Convenções de Genebra

Em 1859, um combate entre o exército francês e austríaco no norte da Itália, conhecida como a Batalha de Solferino, deixa milhares de mortos e uma quantidade ainda mais expressiva de feridos. Tendo presenciado os horrores daquele momento, o suíço Henry Dunant decide pela criação de uma rede de assistência aos feridos de guerra, fundando em Genebra, em 1863, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV).

Em 1864, o governo suíço convoca uma Conferência de Estados que aprova o texto da Primeira Convenção de Genebra. O tratado estabelecia a obrigação dos Estados em conflito a respeitar e cuidar dos militares feridos ou doentes sem discriminação, limitando a barbárie nos conflitos armados e que se tornou base para o Direito Internacional Humanitário (DIH).

Ao longo dos anos, essa convenção continuou se desenvolvendo com a adoção de novos instrumentos internacionais pelos Estados, em especial as Convenções de Genebra de 1949 e os Protocolos Adicionais de 1977. Estas Convenções são um conjunto de regras que protege os civis e as pessoas que não mais participam do combate, incluindo militares feridos e doentes ou prisioneiros de guerra.

swissinfo.ch

Fonte: Swiss Info

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